Defesa em Homicidio Culposo – Acidente de Trânsito

EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) DE DIREITO DA PRIMEIRA VARA CRIMINAL DA COMARCA DE COLATINA/ES

Processo n.º: ……………… – Carta Precatória ……………….
Autor: Ministério Público de Minas Gerais
Réu: ……………………

Juízo Deprecante: Juízo de Direito da Comarca de Coronel Fabriciano/MG
Juízo Deprecado: Juízo de Direito da Comarca de Colatina/ES

A PARTE, brasileiro, casado, motorista, titular do RG 1………MTPA, residente e domiciliado na ……………, km 18, Bairro Ponte do Pancas, Colatina-ES, vêm à presença de Vossa Excelência, por meio de seu advogado e procurador signatário, constituído e qualificado no instrumento de mandato em anexo, com escritório profissional na Travessa Rotary, n° 10, 4° andar, Centro, Colatina – ES, CEP 29.700-240, Tel. (27)3721-1955, endereço indicado para receber as intimações e notificações processuais de estilo (artigo 39, inciso I, do Código de Processo Civil), nos autos do processo em epígrafe, AÇÃO CRIMINAL proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS, vem, respeitosamente apresentar DEFESA PRÉVIA no intuito de que se permitam vislumbradas todas as questões de fato e de direito que formarão o convencimento de Vossa Excelência para que se profira decisão com a mais apurada JUSTIÇA.

SÍNTESE DA DENÚNCIA – BREVE RELATO DOS FATOS

Consta da Denúncia oferecida pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais, por meio do Promotor de Justiça, no uso de suas atribuições constitucionais e legais, que o denunciado …………….., já qualificado nos autos, teria conduzido seu veículo em data de 01 de janeiro de 2009, por volta das 07:10 horas, na BR 381, km 278,5 Município de Antônio Dias, Belo Horizonte/MG, de forma imprudente, sem observar o dever de cuidado objetivo necessário, praticando dois homicídios culposos.

Consta ainda que, conduzia o veículo Mercedes Benz 1620, placa MQH 0967, trafegando no sentido Ipatinga x Belo Horizonte, imprimindo velocidade excessiva, ao passo que não conseguiu realizar uma curva para direita, invadindo a contramão direcional vindo a colidir com a lateral do veículo Caminhonete GM, S10, placas, placas GZK 5077, conduzido por Sérgio Rosa Marteletto.

Informa ainda que permanecendo na contramão após a colisão, chocou-se frontalmente com veículo FIAT/ESTILO, placas HGG 9393, conduzido por Dimas Sebastião Machado Pereira Junior, projetando o mesmo a retaguarda e, após ter feito um movimento retotranslatório, chocando-se com um veículo FIAT/UNO, HCH 4387, conduzindo também no sentido contrário por Allen Leon Silva.

Importa mencionar, que por decorrência de tais colisões informa a denuncia oferecida pelo Órgão Ministerial que 02 (duas) pessoas vieram a óbito, as quais ocupavam o veículo FIAT/ESTILO (Débora Campos Marteletto e Ilda Pimenta Lemos, tudo em conformidade com relatórios de necropsia de fls. 31/32 e 33/35.

Destaca por fim o Parquet, que de acordo o laudo pericial nº 031/2009, de fls. 76/96, que o denunciado desenvolvia a velocidade de 95 km/h, incompatível com as condições de segurança do local.

Diante de todo o exposto, denunciou Renato Batista Zani, como incurso no art. 302 da Lei 9.503/97, por duas vezes, na forma do art. 70, primeira parte, do Código Penal, ao final requereu a condenação do Denunciado.

MÉRITO DA CAUSA

No Direito Penal, sabe-se, o conceito de tipicidade (subsunção da conduta aos elementos do tipo) representa importante avanço, pois que concretiza, definitivamente, o princípio da reserva legal (artigo 5º, XXXIX e artigo 1º, do Codex Penal).

No artigo 302 do CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO está definido o crime de homicídio culposo (preceptum iuris) e as penas previstas, in abstracto, para os seus transgressores (sanctio iuris), nos seguintes termos, verbis:

Art. 302. Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor:
Penas – detenção, de dois a quatro anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.

É consabido que a primeira figura penal que passou a ser regulada pelo CÓDIGO DE TRÂNSITO foi o homicídio culposo, que consiste na eliminação da vida de uma pessoa por ato de outra, através de uma causa gerada por culpa, nas espécies imprudência, negligência ou imperícia.

As modalidades de culpa podem ser traduzidas assim: a) na imprudência há a prática de ato perigoso; b) na negligência há falta de precaução ou cuidados; c) na imperícia, há uma omissão em aptidão técnica, teórica ou prática.

Aduzimos que a imprudência é a prática de uma conduta arriscada ou perigosa e tem caráter comissivo. É a imprevisão ativa( culpa in faciendo ou in committendo). Conduta imprudente é aquela que se caracteriza pela intempestividade, precipitação, insensatez ou imoderação.

Negligência é a displicência no agir, a falta de precaução, a indiferença do agente, que, podendo adotar as cautelas necessária, não o faz. É a imprecisão passiva, o desleixo, a inação (culpa in ommittendo). É não fazer o que deveria ter feito.

Imperícia é a falta de capacidade, despreparo ou insuficiência de conhecimentos técnicos para o exercício da arte, profissão ou ofício. Imperícia não se confunde com erro profissional. O erro profissional é um acidente escusável.

Os limites da norma imperativa encontram-se no poder de seu cumprimento pelo sujeito. Por isso, o dever de cuidado não pode ir além desses limites. A inevitabilidade do resultado exclui a própria tipicidade. Em outros termos, é indispensável que a inobservância do cuidado devido seja a causa do resultado tipificado como crime culposo.

A forma culposa de homicídio só restará tipificada se presentes estiverem os seguintes requisitos: a) comportamento humano voluntário; b) descumprimento de dever de cuidado objetivo; c) previsibilidade objetiva do resultado; d) morte involuntária.

Anotamos, a guisa de ilustração e reforço, que, no tráfego viário tem vigência o princípio da confiança, a ser observado pelos condutores de veículos automotores, para a adequada aplicação das normas de direção, em homenagem à segurança na circulação de veículos. Confia-se, pois, que o condutor segue as regulamentações e regras de trânsito, a fim de delimitar a esfera do previsível.

Assim, desta forma se ao longo da instrução criminal, não forem produzidas provas que demonstrem, quantum satis, que o condutor do veículo automotor envolvido no acidente de trânsito tenha sido, ao tempo do evento, imprudente, negligente ou imperito, restará desautorizada a inflição de penas, em face da atipicidade da conduta.

A conclusão, a par das provas produzidas, sobretudo as amealhadas até a presente data, é que não há dados que legitimem um decreto de preceito sancionatório.

Não há dados que permitam concluir que o denunciado tivesse provocado o acidente por negligência, imprudência ou imperícia.

É truísmo afirmarmos, mas devemos fazê-lo, que para que o juiz declare a existência da responsabilidade criminal e imponha sanção penal a uma determinada pessoa, é necessário que adquira a certeza de que foi cometido um ilícito penal e que seja dela a autoria.

Ao que infiro das provas produzidas, o denunciado dirigia dentro das expectativas impostas pelas normas de trânsito, tendo o resultado lesivo ocorrido por influência de circunstâncias alheias à sua vontade, cuja previsibilidade não era razoável exigir-se da maioria das pessoas que estivessem em idêntica situação, é algo totalmente temerário.

O denunciado, repito, à exaustão, com sua ação, causou um resultado lesivo. Mas não há provas consistentes de que tenha agido sem a observância do dever objetivo de cuidado e que tenha se portado com franca ausência de previsibilidade objetiva e subjetiva. O que há demonstrado, prima facie, é que o fato ocorreu por circunstâncias alheias à sua vontade e fora do seu domínio, daí não ser possível a caracterização de crime em sua modalidade culposa, sendo falha mecânica e dia chuvoso, ou seja, evento da natureza, que deixou a pista totalmente escorregadia.

O denunciado, seguia as recomendações e regulamentações e regras de trânsito, agindo, pois, na esfera do previsível, porém com o tempo chuvoso e falha mecânica, acabou não impedindo o evento, assim não é possível o reconhecimento de sua culpa. E não havendo comprovada a desobediência ao dever de cuidado objetivo imputado ao denunciado, não se pode, validamente, reconhecer a sua culpa, impondo-se a sua absolvição com espeque no artigo 386, VI, do CPP.

In casu sub examine, as provas produzidas até o presente momento, não são suficientes, para expedição de uma condenação criminal. E se as provas apresentadas não forem aptas a apoiar a convicção do magistrado, dando segurança para embasar um decreto condenatório, o denunciado deve ser absolvido, nos termos do artigo 386, VI do CPP. Senão vejamos:

APELAÇÃO-CRIME. ART. 302 DO CTB. FRAGILIDADE PROBATÓRIA. AUSÊNCIA DE TESTEMUNHAS. DÚVIDA QUANTO AO EXATO LOCAL DO ACIDENTE. NÃO COMPROVAÇÃO DA CULPA DO RÉU. ABSOLVIÇÃO QUE SE IMPÕE. Apelo improvido. (Apelação Crime Nº 70022323893, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Manuel José Martinez Lucas, Julgado em 04/06/2008).

38002024 – APELAÇÃO CRIME – PROCESSUAL PENAL – CRIMES DE TRÂNSITO – APELO EM PROL DO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO – OCORRÊNCIA – PROVA CONTRADITÓRIA – SENTENÇA REFORMADA – 1- Evidencia-se nos autos uma real dúvida quanto a coerência das provas que alicerçaram a condenação do apelante. Ademais, as provas que apontam o comportamento imprevisível da vítima para a eclosão do evento fatídico são fartas e diversas, não se resumindo ao interrogatório do apelante, mas somando-se às provas testemunhais e pericial, de forma que, a absolvição é medida que se impõe, em respeito no preceito do in dubio pro reo. 2- Apelo provido. Decisão unânime. (TJCE – ACr 2005.0013.2041-8/0 – Rel. Des. Raimundo Eymard Ribeiro de Amoreira – DJe 10.03.2009 – p. 18)

20000007187 JCTB.302 JCTB.302.PUN.I JCP.44 – APELAÇÃO CRIMINAL – HOMICÍDIO CULPOSONO TRÂNSITO – ARTIGO 302, PARÁGRAFO ÚNICO, INCISO I, DA LEI Nº 9.503/97 – ABSOLVIÇÃO – IMPOSSIBILIDADE – SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITO ALEGADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO AD QUEM – POSSIBILIDADE – RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO – Em se tratando de homicídio culposo no trânsito, é indispensável, para a caracterização da culpa, que reste provado ter o acusado praticado o crime com negligência, imperícia ou imprudência. Condenação mantida.- Circunstâncias que garantem ao Apelante seja sua pena substituída por restritivas de direitos, já que se enquadra nas hipóteses do artigo 44 do Código Penal, em que deverá o Juízo das Execuções Penais competente proceder ao exame dos requisitos objetivos e subjetivos autorizadores do benefício da substituição e aplicá-las.- Recurso conhecido a que se nega provimento. (TJMA – ACr. 015233/2007 – 2ª C.Cr. – Rel. Des. Raimundo Nonato de Souza – DJe 03.06.2008).

Fonte: Júris Síntese – IOB – Março/Abril de 2009.

Decidir em desfavor do denunciado, com espeque em incertezas, seria, decidir arbitrariamente. Seria, releva dizer, afrontar o princípio da livre convicção, transformando-o em arbítrio, pura e simplesmente.

É evidente, não custa lembrar, que o juiz criminal não fica cingido a critérios tarifados ou predeterminados quanto à apreciação da prova. Não é demais repetir, no entanto, que fica adstrito às provas constantes dos autos em que deverá sentenciar, sendo-lhe vedado não fundamentar a decisão, ou fundamentá-la em elementos estranhos às provas produzidas durante a instrução do processo, afinal quod non est in actis non est in mundo.

Pise-se que o denunciado, estava sim guiando com acuidade e prudência, em velocidade compatível com o local, tendo em vista que trafegava com velocidade compatível com a BR 381, conforme o depoimento do denunciado, que seu veículo estaria com a velocidade aproximada de 70 Km por hora, sendo assim velocidade totalmente compatível com uma BR.

Relata também, que o dia estava chuvoso, e que o freio falhou, no momento que necessitou deste, daí, podemos concluir que diante de toda estas questões, o denunciado não teve como evitar o evento, fugindo-se assim do seu controle, ou seja, o evento foi causado por situações alheias que não dependeram da perícia do denunciado.

O decreto condenatório precisa estar fincado sobre os elementos carreados ao processo e que ofereçam ao magistrado sentenciante a pacífica certeza da ocorrência dos fatos censurados e apontem sua autoria. Existindo fragilidade nas escoras probatórias, todo o juízo edificado padece de segurança, dando margem às arbitrariedades e pondo em risco o ideal de justiça preconizado pelas sociedades democráticas, o que acarreta diretamente na sua absolvição nos termos do artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal Brasileiro. É o que se requer.

DO DIREITO QUE POSSUI O DENUNCIADO À SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE APLICADA PELA PENA RESTRITIVA DE DIREITOS.

Em restando desabrigadas as teses oras esposadas, requer, o denunciado, desde já, a Substituição da Pena Privativa de Liberdade, por ventura aplicada, por uma ou mais Penas Restritivas de Direitos, já que preenche todos os requisitos exigidos pelo artigo 44 e seguintes do Código Penal Brasileiro.

É forçoso reconhecer, como dito, que o ora Denunciado atende a todos os citados requisitos exigidos; a saber:

A pena privativa de liberdade não ultrapassa 04 (quatro) anos (tendo em vista a natureza do delito, as circunstâncias do mesmo, bem como a condição do denuciado);

O Denunciado é primário;
Não reincidente em crime.

Nesse passo, não restam dúvidas de que o Denunciado, acaso condenado a pena privativa de liberdade, preenche os requisitos dispostos no artigo 44 e incisos do Código Penal Brasileiro, tendo direito subjetivo à Substituição da Pena Corporal por ventura aplicada por uma ou mais Penas Restritivas de Direito.

DOS REQUERIMENTOS

Postas tais considerações e por entendê-las prevalecentes sobre as razões que justificaram o pedido de condenação despendido pelo preclaro órgão de execução do Ministério Público, confiante no discernimento afinado e no justo descortino de Vossa Excelência, a defesa requer a ABSOLVIÇÃO do réu, à guisa das teses ora esposadas.

Por fim, ultrapassadas as teses supra elencadas, acaso condenado, seja substituído por penas restritivas de direito, haja vista que o denunciado preenche os requisitos dispostos no artigo 44 e incisos do Código Penal Brasileiro, tendo direito subjetivo à Substituição da Pena, por ventura aplicada por uma ou mais Penas Restritivas de Direito, bem como sejam observadas as atenuantes que o caso requer.

Protesta por todos os meios de provas admitidos em direito, especialmente prova testemunhal.

Neste Termos, Pede deferimento.
Colatina-ES., 11 de Agosto de 2009

Pedro Costa
OAB-ES 10.785