É impenhorável bem de família para quitar indenização originada por erro médico

A Lei nº 8.009, de 29 de Março de 1990, que dispõe sobre a impenhorabilidade do bem de família, considera residência o único imóvel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente. Na hipótese de o casal, ou a entidade familiar, ser possuidor de vários imóveis utilizados como residência, a impenhorabilidade recairá sobre o de menor valor, salvo se outro tiver sido registrado, para esse fim, no Registro de Imóveis (art. 5 da Lei 8.009/90).

Além disso, estabelece, no artigo 1º, que o bem de família é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de qualquer outra natureza.

Todavia, elenca algumas hipóteses em que o bem de família pode ser penhorado, entre elas: a) em razão dos créditos de trabalhadores da própria residência e das respectivas contribuições previdenciárias; b) pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato; c) pelo credor de pensão alimentícia; d) para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar; e) para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar; f) por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens; por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

Diante das exceções mencionadas acima, deve-se ter claro, para se defender a impenhorabilidade, a diferença entre as indenizações decorrentes de sentenças condenatórias criminais e aquelas decorrentes de execução civil, especificamente aquelas decorrentes de indenizações por erros médicos.

Recentemente, em decisão unânime, os ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiram que o imóvel residencial da família não pode ser penhorado para pagar dívida de condenação civil, ainda que derivada de ilícito penal.

Entretanto, até que esta decisão fosse tomada, as instâncias inferiores depararam-se, diversas vezes, com a diferenciação entre a indenização decorrente de sentença condenatória criminal e aquela decorrente de condenação civil, derivada de ilícito penal.

Isso porque, o juízo singular condenou a médica à indenização por danos morais e materiais. A profissional da saúde foi executada para cumprir a determinação judicial, tendo seu único imóvel residencial penhorado. Diante disso, a médica defendeu a impenhorabilidade do imóvel de sua propriedade, eis que se tratava de bem de família, mas a sentença não reconheceu a referida impenhorabilidade.

Ainda, em grau recursal, o Tribunal de Justiça do Paraná manteve a decisão do juízo monocrático, por entender ser possível a penhora de imóvel residencial do devedor, mesmo no caso de não existir sentença penal condenatória. O TJPR ressaltou que, embora a ação fosse de natureza civil (indenização por danos morais e materiais), ela decorre de um ilícito penal (erro médico) com repercussão na esfera cível.

Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça, ao contrário das instâncias inferiores, decidiu que a culpa que leva à condenação no juízo cível nem sempre é suficiente para condenar alguém na área penal.

O relator, Ministro Luis Felipe Salomão, ressaltou que, excepcionalmente, a Lei nº 8.009/90 permite a penhora para execução de sentença penal condenatória no caso de ressarcimento, indenização ou perdimento de bens. Contudo, não é possível ampliar essa restrição, de modo a remover a impenhorabilidade do bem de família quando não houver expressamente sentença penal condenatória.

Com isso, a impenhorabilidade alegada pela médica foi reconhecida pelo STJ, afastando-se a penhora do imóvel considerado bem de família.

Pelo exposto, quando se tratar de indenização por erro médico, não se pode aplicar a exceção prevista no inciso VI, do artigo 3º da Lei 8.009/90, pois tal indenização, embora derivada de ilícito penal, não decorre expressamente de sentença penal condenatória.